quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

O ser humano e os valores

O ser humano é sujeito de muitas necessidades. Algumas são naturais, outras são adquiridas. Necessidade é o dinamismo que move o ser humano na busca do que lhe é conveniente. E o que é conveniente a alguém chama-se bem. Quando o bem for julgado pelo sujeito como resposta satisfatória às suas necessidades, torna-se um valor. Através de um juízo de valor, o homem julga convir a si mesmo o bem que lhe confere valor, que dá perfeição. E a perfeição é a finalidade do agir humano. Daí a preocupação, o interesse de pensar a realidade em função do valor que possui para a plenificação da pessoa humana.
O ideal que está no horizonte dos projetos humanos é o desejo de sentir-se completo, totalmente feito (per-feito) pelos valores correspondentes à heterogeneidade de suas necessidades biológicas, estéticas, econômicas, morais, etc. A determinação da escala dos valores deve levar em consideração o modo de relacionamento do indivíduo segundo a preferência de satisfação de suas necessidades. Os valores religiosos estão escalonados num âmbito superior, segundo Scheler, acima dos valores infra-humanos (biológicos), dos valores inframorais (noéticos, estéticos, sociais) e dos valores propriamente morais. Contudo, os valores religiosos abrangem os valores morais. O valor sagrado é um valor racional podendo ser supra-racional, mas nunca é irracional (contra a reta razão). O valor religioso abrange o valor moral natural, podendo ultrapassá-lo por valores sobrenaturais. Os valores religiosos são os valores mais sublimes, mais perfeitos que conduzem a suma perfeição. O ideal humano é o ideal de perfeição, e isso, os valores religiosos podem nos proporcionar em plenitude.
A filosofia é a ciência que busca o conhecimento da verdade. O filósofo é aquele que é amigo do saber. Os primeiros filósofos foram aqueles que primeiramente propuseram as questões existenciais, desvinculando a explicação das origens da vida e da ordem do cosmos das fábulas míticas das teogonias. A asserção “amor pela sabedoria” caracteriza o filósofo, que é aquele que ama a sabedoria, aquele que é amigo da sabedoria, como nos transparece o próprio significado etimológico da palavra “filosofia” (do grego filos: amigo; sofhia: sabedoria). Assim, o sentido do humano deveria ser o objetivo principal e natural da filosofia, devido à compreensão que se tem como ciência humana, amor ao saber. Scheler embasa seu protagonismo filosófico no amor como força propulsora para uma sincera busca da verdade fundamental.
O amor constitui uma forma de conhecimento afetivo profundo do valor que é iluminado pelo intelecto. Os “pensamentos do coração” são envoltos de afetividade nos quais o valor se revela. Afetividade é a presença do prazer na satisfação de necessidades causadas pelo valor. O valor afetivamente nos realiza, e os valores mais elevados, o fazem de maneira mais plena.
Pelo modo como se porta, o sujeito vai criando seu modelo de vida, sua personalidade moral, seu ethos. O ethos é o lugar interno do homem, seu caráter moral adquirido através de atos e hábitos. Cada homem constrói seu ethos pessoal conforme as circunstâncias em que vive, e guia-se por esse ethos. O ethos é o fundamento e a orientação da práxis humana.
Podemos compreender o anseio social hodierno nessa crise de valores. "O homem é naturalmente axiotrópico: vive à caça de valores." (EMPINOTTI). O homem os sente, experimenta-os, "preenche o vazio ontológico de sua sede de perfeição. Nem sempre, entretanto, é feliz nesta aventura gostosa da existência e isto porque sua essência não encontrou o alimento propulsor." (EMPINOTTI). O homem anseia à eternidade, à perfeição, anseia pela plenitude. Nesse sentido, "a pessoa humana deve sentir a presença efetiva e eficaz dos valores, que no final é o que importa para uma vida rica em plenitude." (EMPINOTTI). A axiologia nasce da ontologia, se afirma na ética e de expande na deontologia (dever). Em Max Scheler o ponto de ignição axiológico se dá no campo psicológico, no "sentir emocional" que se expande na fenomenologia, para culminar na dimensão do sagrado.
A realização pessoal acontece quando realizamos ao nosso irmão que está do nosso lado. O amor que nos impulsiona ao sagrado é o amor-caridade. Esse amor edifica, constrói, dignifica a pessoa humana. Esse amor amplia o nosso horizonte axiológico. Esse amor é que deve mover a nova educação na sociedade que almejamos. Contudo, a caridade não espera, ela faz. Não podemos esperar que os políticos deixem de roubar, ou que os sistemas de governo realizem todas as utopias humanas. Temos que começar agora, ou seremos cúmplices das barbáries que acontecem hoje na sociedade. Não podemos continuar sendo coniventes com o sistema atual que ministra o status quo social. Há um ditado que diz “quem cala consente”. Não podemos dar o nosso consentimento ao que acontece hoje no âmbito social e político. Temos que pautar as nossas relações pelos valores que Scheler dizia serem os mais sublimes, os valores que fundamentam toda a escala dos demais valores vitais para a realização da pessoa humana. Mas estes valores não se realizaram na materialidade da existência se antes não se desalienarem do seu estado ideal para constituir um estado de coisas real e palpável pelas nossas ações intencionais.

2 comentários:

  1. Adorei seu texto, estou estudando a filosofia dos esportes e você me ajudou a compreender essas diferenças práxico e axiotrópico, e pelo que vejo os outros textos tbm são bons!
    grato

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